Larissa saiu de Maysa, mas será que Maysa saiu de Larissa? Atriz e cantora enovelaram-se de forma tão intensa na minissérie exibida em 2009 que esta gaúcha de grandes olhos azuis vive a cada dia o desafio de provar que não é mulher de um papel só. A delicada Felícia, da novela Passione, da Globo, é a prova de fogo
Durante cerca de um ano, Larissa Maciel e Maysa Matarazzo pareceram ter se fundido numa só pessoa, tal a semelhança física entre atriz e personagem. Larissa fez a cantora renascer na minissérie Maysa – Quando Fala o Coração, exibida em janeiro de 2009 na Globo. A intensidade que a personagem pedia encontrou uma intérprete à altura, que se entregou de corpo, alma e cara para bater. Os enormes olhos azuis de Larissa estreavam em horário nobre com status de protagonista. E arrasaram.
No meio artístico, costuma-se dizer que estreias assim grandiosas são facas de dois gumes. Ao mesmo tempo que trazem do anonimato um rosto novo e o projetam para o grande público com a força de uma explosão atômica, deixam na carreira do ator (ou atriz) em questão uma marca quase indelével. Há quase dez anos, por exemplo, Mel Lisboa luta contra o fantasma de sua personagem em Presença de Anita – outra estreia memorável.
Mesmo depois de muitos papéis, Alessandra Negrini ainda é lembrada pela espetacular Engraçadinha (1995). Como escapar dessa bênção que pode ser maldição? “As pessoas comparam grandezas diferentes. Eu tenho uma história, uma carreira”, responde Larissa, com voz firme, lembrando a trajetória nos palcos de Porto Alegre, onde nasceu há 33 anos. Até 2008, atuava no teatro local e em especiais da RBS TV, afiliada gaúcha da Rede Globo. A virada se deu pelas mãos de Léo Gama, produtor de elenco da emissora carioca, que a viu em cena e convidou-a para o teste que escolheria a protagonista da minissérie com direção do filho da personagem-título, Jayme Monjardim. Larissa fez as malas e foi para o Rio. “Nunca imaginei que fosse estrear em um projeto como aquele, com todos os desafios que uma atriz procura. Fiquei tão apaixonada pela Maysa que nem pensei muito no que estava acontecendo”, conta a atriz. “Foi bem tranquilo, até porque eu andava pelo Projac (estúdios da TV Globo no Rio) incógnita; ninguém sabia quem eu era enquanto gravava. Só fiquei conhecida depois da estreia.”
O AVESSO DE MAYSA
Então veio a oportunidade de Larissa provar a multiplicidade de seu talento com Felícia, na novela Passione, de Silvio de Abreu. Era justamente o avesso de Maysa. A mulher forte, determinada e contrária às regras impostas pela sociedade deu lugar a uma moça dócil, generosa, tímida e tão compreensiva que chega a irritar o público feminino que a acompanha do outro lado da tela. “É preciso muita sensibilidade para interpretar a grandeza dessa personagem. E muita disciplina também, o que Larissa tem de sobra”, ressalta Tony Ramos, com quem ela contracena no folhetim. Mais um desafio para a atriz, que fez de tudo para evitar que Felícia se tornasse uma chata. “No início da novela, as pessoas se aproximavam de mim para comentar que conheciam muitas Felícias, mulheres que não acreditam no seu potencial, que se acham incapazes, maravilhosas com o resto do mundo, mas ruins com elas mesmas. E todas me diziam que queriam ver a Felícia mudar de vida.” O apelo das telespectadoras foi ouvido pelo autor da trama e Larissa está em plena repaginação – para viver o romance com o ator Marcelo Anthony, que pode ser o auge da personagem na novela. “A beleza dela, calma e discreta como a de Felícia ou forte e marcante como a de Maysa, é um grande trunfo para qualquer atriz”, afirma Silvio de Abreu. “Larissa alia isso tudo a enorme talento, bastante estudo e muito trabalho. É uma atriz de futuro e esse futuro já chegou.”
Como Maysa, na minissérie que lhe trouxe fama: paixão pela cantora
Até chegar aqui, a persistência foi a maior companheira de Larissa. É preciso muita vontade para resistir às adversidades de uma profissão tão instável como a artística, ainda mais para quem não vive no eixo Rio-São Paulo. Em Porto Alegre, ao mesmo tempo que atuava, produzia, carregava e montava cenários, ela se sustentava usando o talento em outras searas. “Eu aplicava técnicas teatrais em treinamentos em empresas. Ensinava métodos para os funcionários colocarem melhor a voz e mudarem a postura”, conta. O maior medo era ter de desistir da profissão que tinha escolhido e a levara a cursar artes cênicas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Não foi necessário. Maysa a alçou à posição de estrela no momento certo, segundo ela, uma responsabilidade e tanto para uma estreante em esfera global, apesar do longo caminho que já havia percorrido. “Estava vivendo uma fase muito tranquila, até porque já era uma mulher feita. E meus pais (Pedro e Elaine) me apoiaram muito.” Na transição do Rio Grande do Sul para o Rio de Janeiro, a distância da família foi o passo mais difícil. A falta dos pais e do irmão, Fábio, é permanente. “Quando ligo para minha mãe num domingo e ela me conta que estão todos reunidos em volta da churrasqueira, bate aquela saudade”, confessa. Da casa grande na capital gaúcha, Larissa teve de se adaptar à vida impessoal e solitária de um aparthotel no Rio. Para completar, ainda foi obrigada a driblar o afastamento do então namorado – e atual marido –, André Surkamp, 32 anos, ex-baixista da banda Bidê ou Balde e administrador de empresas.
Amor na fila do banheiro
“Acho que encontrei o homem da minha vida”, disse Larissa a uma amiga assim que voltou para a mesa do bar depois de ter visto André pela primeira vez. “A gente se conheceu da maneira mais romântica que pode acontecer: na fila do banheiro”, lembra ela, rindo muito. Depois de nove anos de namoro, Larissa e André se casaram, em setembro de 2009, numa cerimônia para poucos, sofisticada, realizada num hotel de Porto Alegre. Como as famílias são de religiões diferentes – ela é católica e ele luterano –, o padre foi substituído por um amigo do casal, o ator André Mubarack, que trocou o texto tradicional pela narração da história dos recém-casados. “Planejamos tudo nos mínimos detalhes. Foi um sonho mesmo. Por isso aconselho: na dúvida, case!” Pouco mais de um ano após o casamento, a lua de mel ainda não acabou. Os dois, que já badalaram muito pelas noites gaúchas, estão naquela fase de recolhimento romântico em que a casa é o melhor lugar do mundo. “Gosto de ficar quietinha, com meu marido, vendo um filme.” Nos fins de semana, quando o tempo é livre, eles exercitam os dotes culinários com trilha sonora devidamente selecionada pelo maridão, dono de uma coleção de discos de vinil. Cozinhar, para Larissa, é uma espécie de terapia. Comprou um livro de culinária e tenta dar um toque especial a cada prato que prepara. “Eu pego a receita tradicional e experimento outras coisas. Se dá certo, anoto e falo que foi criação minha.”
O aconchego do lar é dividido com dois gatinhos, Mia e Manu, resgatados na rua e adotados pelo casal. “Ficaria com a consciência pesada se comprasse um bicho de estimação, já que há tantos por aí sem cuidados”, diz. Eis que Larissa entrega seu lado Felícia, sempre preocupada com os outros. Mas, quando o assunto é relacionamento amoroso, é Maysa quem dá as cartas. “Jamais aceitaria, como a Felícia, ocupar o segundo lugar no coração de um homem. Se ele me demonstrasse isso de alguma forma, eu o mandaria ficar com a outra e ponto final.” Larissa considera-se uma mulher bem-resolvida. Atualmente, não frequenta terapia, o que fez dos 5 aos 9 anos, porque era considerada adulta demais para a idade. “Talvez, quando tiver filhos, volte para a análise. Sei me administrar bem, mas acho que, com as crianças, tudo muda muito.”
Retorno às raízes
Para lidar com o sucesso, o assédio, as críticas e escolher novos trabalhos, Larissa contratou uma empresária experiente, Márcia Marbá, irmã de Angélica, que assessora outras atrizes, como Grazi Massafera. “Ela faz uma orientação da carreira, mas não impõe nada. Além disso, sabe quantificar o valor de cada trabalho”, conta. O próximo já está em curso. Larissa está envolvida nos ensaios da peça A Eva Futura, com estreia prevista para janeiro, no Rio, ao lado de Pedro Paulo Rangel, com direção de Denise Bandeira. No espetáculo, adaptado da obra do francês Auguste Villiers de L’Isle-Adam, publicada em 1886, ela vai interpretar uma androide que ganha, pelas mãos do cientista americano Thomas Edison, os atributos da bela, mas nada brilhante Alicia. “Estou muito feliz em fazer essa peça. O teatro mexe profundamente com a energia do ator”, comenta a estrela, que volta às raí zes em busca de Larissa – nem Maysa nem Felícia.